sábado, 30 de dezembro de 2017

Retrospetiva do ano

Nestes anos todos de luta 2017 foi, sem dúvida, aquele que mais me colocou à prova a diversos níveis. Quase todos os meses estiveram associados à causa da infertilidade. Fosse em preparação de transferências, esperas por beta, colheitas de sangue, ecografias, abortos e hemorragias, parece que não aconteceu mais nada. Devo ter chegado perto da casa dos milhares de comprimidos num só ano. Pensei que finalmente no início de 2018 ia poder contar, a quem me é próximo, que a probabilidade de ampliarmos a família era uma realidade possivelmente exequível.

Casei nuns minutos de intervalo, pois a TEC era prioridade, fiquei sem embriões, voltei à estaca zero.

O ano resumiu-se a 6 embriões transferidos, 2 degenerados, 1 TEC negativa, a segunda gravidez que se chegou a julgar ectópica, a terceira gravidez, com um saquinho perfeito, que terminou com uma aspiração.

Hoje, pela primeira vez em muitos dias, não perdi sangue. Há tanto tempo que isso não sucedia, parece que tenho dificuldade em acreditar que esse episódio interminável finalmente chegou ao fim. Nos primeiros dois dias após a aspiração tinha umas perdas ligeiras que pareciam de sangue diluído contudo, na véspera de Natal, acordei com o pijama ensanguentado.

Recuso-me a fazer resoluções para 2018 ou pedir desejos vãos para mim. Às resistentes que lutam e sonham como eu com o dia em que este pesadelo termina, só queria ter o poder de vos dizer o dia e a hora exata em que isso vai acontecer para atenuar a vossa dor. Não vos queria ver a passar por esta provação.

Há uma música cujo título me recordo muitas vezes, "Killing me softly", que traduz aquilo que a infertilidade me tem feito. Esta espécie de masoquismo está a chegar ao fim, seja pela via do sucesso ou pela constatação que este campeonato não vai trazer frutos. Estou cada vez mais próxima de me libertar deste fardo que tenho carregado.

Uns dias após o término do ano virá o meu aniversário e quase de seguida a última FIV. Aguardo sem euforias o ano de 2018.

sábado, 23 de dezembro de 2017

Acerca da aspiração

Desloquei-me à urgência de obstetrícia de manhã e fui recebida no consultório por dois médicos e uma médica. Quiseram saber o que aconteceu, pelo que sintetizei a situação. Com uma postura algo rude um dos médicos perguntou-me o que me foi dito na última vez que tinha ido àquele serviço. Respondi que ficou combinado ir lá no dia 28 de dezembro para fazer a raspagem, contudo como continuava a libertar coágulos e a hemorragia estava aumentar novamente, comuniquei a situação à equipa de Medicina de Reprodução. A indicação que a Diretora tinha dado era que deveria proceder imediatamente à raspagem, não podendo ficar a aguardar até ao dia 28. Obtive como resposta "Quem decide se faz agora ou não, somos nós". Fizeram-me ecografia através da qual viram que de facto ainda havia conteúdo espalhado em várias zonas, um dos vestígios tinha 15 mm. Concluíram que iria fazer aspiração. Por precaução questionei se o conteúdo ia para análise. Parecia que estavam a estranhar a minha pergunta, então referi que havia a suspeição de que o embrião tivesse uma anomalia genética. O médico com a postura resistente disse "vocês não fizeram estudo de cariótipos?". Respondi afirmativamente, foi das primeiras coisas que se despistou antes de iniciar lá os tratamentos e ambos são normais. Ouvi da parte dele "então os vossos embriões não têm alterações se está tudo bem convosco".

Os meus conhecimentos de biologia ao nível da divisão celular e de genética datam de uma aprendizagem realizada já no século passado mas, se não estou enganada, podem ocorrer erros na meiose, assim como nos processos de replicação, transcrição e tradução do ADN, que geram mutações. Pareceu-me que assumir que cariótipos normais geram sempre embriões sem anomalias terá sido um erro. Como não sou expert, vou tornar a estudar o assunto.

Frisei que era o terceiro aborto e está previsto realizar a última FIV em fevereiro. A equipa médica de PMA salientou que precisa ter esse esclarecimento antes de se fazer novo tratamento. O médico disse então que a amostra iria ser enviada para análise. Como na urgência há dois blocos que naquele momento estavam a ser usados e um tem de estar sempre disponível para grávidas (senti-me reduzida a pó), teria de voltar às 13 horas para se proceder à aspiração, mantendo o jejum. A última refeição que tinha feito fora o jantar do dia anterior.

À hora indicada apresentámo-nos novamente na urgência, entrámos para uma sala onde se encontravam parturientes com os respetivos companheiros, em camas separadas por cortinas. Eu e o meu marido ficámos sentados em dois cadeirões na entrada desse espaço. Mesmo ao meu lado, para lá da cortina, havia uma grávida cujo filho tinha os seus batimentos cardíacos a serem monitorizados. Era um ruído frenético, em que se notava por vezes alguma arritmia como vieram a confirmar. Fora isso, e os momentos em que as enfermeiras falavam de forma mais agitada, não imaginava que uma concentração de mulheres em trabalho de parto se traduzisse numa calma e sossego daquela dimensão. Uma a uma foram administrando a epidural. Enquanto isso nós aguardávamos que um bloco ficasse disponível para deitar para fora o oposto da vida. Estava com as mãos e pés gelados, com fome, a ouvir por um lado, um rádio que tocava baixinho naquela sala, por outro gritos de bebés que tinham acabado de nascer nos blocos. Comentavam que era um dia atípico pela quantidade de nascimentos. Os bebés tinham decidido antecipar a época festiva. O meu Natal tinha acabado umas semanas antes. Para aumentar o sentimento de inutilidade estava ali a testemunhar o milagre da vida enquanto aguardava pela limpeza dos restos que já eram nocivos para o meu equilíbrio. Tranquilizava-me a ideia de haver finalmente uma amostra para analisar para compensar a frustração de não ter conseguido salvar nenhuma naquele maldito dia. Nada me garante que o resultado vá ser conclusivo, pois passou muito tempo desde o aborto.

Numa brecha que as enfermeiras tiveram, lembraram-se que estávamos nos cadeirões. Perguntaram-me quando é que tinha comido pela última vez, pois supunham que tivesse sido há muito tempo. Quando respondi que tinha sido no jantar do dia anterior conversaram entre si para decidir se podiam colocar-me a soro. Acharam que sim e passado talvez mais de meia hora, já depois das 16 horas, apareceram com o material. Começou a caça à veia nas duas mãos. Como referi anteriormente, tinha as mãos frias, que não é habitual em mim. As minhas veias são finas por natureza, com frio pior ainda. Mesmo com garrote e pancadinhas elas não dilatavam. Uma das enfermeiras procurou e não encontrou nada. Outra aventurou-se e começou a introduzir o catéter numa que se revelou timidamente. A veia rebentou logo, já não podia ser usada. A alternativa encontrada foi aquecer-me. Foram buscar um lençol aquecido e um saco de soro quente para colocar por cima da outra mão e do braço. Estive assim durante algum tempo até chegar a hora de nova caça. As veias continuavam escondidas, então veio outra enfermeira tentar a investida. A solução estava numa veia na parte lateral do pulso que, pessoalmente, é mais doloroso para mim. Muito devagarinho ela foi introduzindo o catéter, quase no limiar de rebentar nova veia. Conseguiu completar com sucesso, todos nos sentimos aliviados por se ter colocado o catéter. Fui colocada a soro para atenuar a fome e permaneci no cadeirão até quase às 17 horas. Quando finalmente um bloco ficou disponível fui chamada e encaminhada para outro cadeirão no meio de uma zona de passagem ampla entre várias salas. O anestesista veio ter comigo para fazer as perguntas da praxe. Voltei a falar da importância de os tecidos serem analisados, então tranquilizou-me dizendo que ia reforçar ao médico que ia fazer a aspiração. Fui para o bloco onde me deparei com uma marquesa de ginecologia um pouco mais complexa do que o habitual. As pernas ficaram elevadas nuns apoios azuis almofadados que as envolviam quase até ao joelho. Dava para aquecer um pouco daquele frio da sala. Cada braço ficou em suportes, igualmente envolvidos. Tinha oxímetro num dedo e medidor de tensão no outro braço. Foram colocados os elétrodos para monitorização cardíaca e um lençol quentinho a cobrir peito e braços. Prepararam as luzes e uma das enfermeiras queria trazer o aspirador para o bloco. Comentou que não gostava de o fazer com as pacientes acordadas, então acharam melhor sedar-me. O anestesista avisou-me que me iam adormecer, colocou-me uma máscara à frente e pediu para que inalasse profundamente. À medida que inalava sentia o líquido anestésico a circular no braço e a visão a duplicar. A última coisa que ouvi foi para pensar em coisas boas. Não tive tempo...

Acordei no recobro com um aquecedor a ventilar para o interior do lençol. Senti imediatamente dores, a enfermeira estava ao meu lado e perguntou se estava tudo bem. Queixei-me das dores, ela disse que era normal e perguntei se me podia virar para o lado. Como não havia problema fi-lo e ajudou a aliviar. Tentei dormir mais um pouco, embora não tenha conseguido, aquele bocadinho em que mantive os olhos fechados serviram para que deixasse de sentir dor. A cada 15 minutos era feita monitorização automática da tensão. Inicialmente ignorei, mais tarde comecei a espreitar. Chegou a estar 8/6. De vez em quando perguntavam-me se me sentia bem. A dada altura vi uma enfermeira sair muito rapidamente do bloco de partos com um bebé nos braços para a sala de reanimação. Ele estava sôfrego a chorar. Passado pouco tempo, na cama ao meu lado chegam a recém-mamã e o pai desse bebé. Era o que estava com arritmia. Levaram-no para junto dos pais, então a enfermeira perguntou se eu sentia frio. Disse-lhe que não e ela levou o aquecedor para junto deles. Ao mesmo tempo que esse casal ouvi aqueles dados que os recém-papás querem saber sempre sobre os seus rebentos - o peso, tamanho e perímetro cefálico. A enfermeira trouxe-me em seguida chá com bolachas, o frasco do fármaco tinha terminado e voltou a colocar o soro. Permaneci no recobro mais algum tempo. A bexiga começou a encher muito rapidamente até que já incomodava. Aproveitei a passagem da enfermeira para pedir para ir à casa de banho. Sentei-me durante um pouco na beira da cama e pude voltar para a zona dos cadeirões e grávidas em trabalho de parto onde se encontrava o meu marido, porque ia ter alta. Já eram 19h30, estava a levantar-se para perguntar por mim quando cheguei ao pé dele. Fui à casa de banho, vesti-me, enquanto isso a enfermeira foi saber junto do médico se podia ir embora. Ele veio ter comigo e disse que correu tudo bem, os tecidos foram enviados para análise citogenética e à partida não iria ter grandes perdas por causa da aspiração, nem deveria sentir dores. Fomos com a enfermeira retirar o catéter e finalmente viemos embora.

Em diversas circunstâncias em que estive em ambiente de ambulatório, agora ou no passado, assisti a discussões entre profissionais de saúde dentro da mesma categoria profissional ou com funções diferentes, que não se coíbem de se afirmar hierarquicamente, em tom de voz elevado, sem se preocuparem se os utentes estão ou não a prestar atenção. Faz-me confusão esse tipo de atitude, a meu ver desagradável.

Daqui a três semanas ligo para o piso 3 para relembrar que fiz a aspiração, assim as médicas vão-se mantendo atentas ao computador para ver quando saem os resultados e avisam-me logo que saibam alguma coisa. Parece-me que o meu caso está a chamar a atenção pela complexidade.

Um dos aspetos que me está a causar algum incómodo é que provavelmente vou saber se o embrião era de um menino ou menina. Esse pormenor torna tudo mais próximo e doloroso porque, de certa forma, personifica mais aquele que apelidava de mini-nós. Seria o meu filho ou a minha filha que nunca iremos conhecer e para o/a qual não tivemos tempo nem coragem de perspetivar nada para o seu futuro.

Todos os dias penso que 6 de junho de 2017, 2 de fevereiro de 2018 e 17 de julho de 2018 poderiam ser datas tão significativas para nós... O destino tem-nos fintado com esperanças medíocres. Acena-nos com uma cenourinha para, logo de seguida, começar a fugir com os nossos sonhos. Pensei que fosse ficar mais perturbada por estar no meio de um ambiente oposto ao do piso 3. Mas que foi irónico, isso foi. Vou interpretar este episódio como a última partida de mau gosto que o ano de 2017 me pregou.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

Fim de mais um capítulo

Por fim terminado. O ponto final tardou em chegar, agora posso fazer o meu luto em paz.

O dia foi longo. Estou fisicamente cansada e a começar a ter algumas dores, por isso vou ser muito breve. Cheguei a casa há duas horas, fui depois jantar, agora vou repousar.

Não foi feita raspagem, mas sim aspiração e os tecidos removidos foram para análise citogenética. Hoje nasceram vários bebés, o pessoal de enfermagem estava admirado com a quantidade de rebentos que decidiu antecipar o Natal. Tive de esperar por não sei quantos partos em jejum desde o jantar de ontem até perto das 17 horas.

Amanhã desenvolvo o que aconteceu, tenho de descansar.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

Vem o inevitável

Ontem continuei a expulsar coágulos e como passaram 4 semanas, liguei no final desta manhã para o piso de Medicina da Reprodução que me aconselhou a ir à urgência de obstetrícia, porque caso fosse necessário fazer análises, lá têm mais facilidade em obter o resultado de forma célere.

Cheguei por volta das 13h30, ainda não tinha almoçado, e como o atendimento estava a demorar fui à máquina de snacks comprar uma saqueta de maçã desidratada e um chocolate. Quando fui chamada para o consultório fiz o resumo do que aconteceu e foi feita a primeira ecografia. A médica observou, mediu, passado algum tempo disse que parecia ter visto algo na parte superior do útero. Pediu-me autorização para chamar um colega para dar uma segunda opinião. Veio então outra médica, fez nova ecografia, referiu que podia estar a menstruar, ao que respondi que normalmente só acontece se tomar medicação. Justificou que as mudanças hormonais podem ter provocado a vinda da menstruação. Concluiu que ainda não saiu tudo. Uma imagem de coágulos é idêntica à de restos de tecido embrionário, mas de facto continuo a ter material no útero.

Quando me estava a vestir perguntaram-me há quanto tempo não comia. Percebi logo a intenção. Voltei para junto das médicas, então calcularam que só às 21h estaria em jejum e podia fazer uma curetagem. Não me perguntaram se estava acompanhada. O meu marido estava a trabalhar e tinha de sair mais cedo para ter uma consulta no Hospital de Gaia. Para me prevenir tinha ido de autocarro em vez de carro, porque não sabia o que iam fazer. Deram também a opção de aguardar mais uma semana para libertar mais alguma coisa e fazer logo a seguir a curetagem. Primeiro sugeriram o dia de Natal, depois o dia de Ano Novo. Viram melhor a previsão de serviço e apontaram o dia 28. Ficou combinado para essa data. Quando saí da urgência desci um piso e fui dar feedback do que aconteceu junto da Medicina da Reprodução. A Diretora disse que dia 28 é demasiado tarde, ainda para mais se continuam a sair coágulos. Ficou estipulado esta quinta-feira voltar à urgência em jejum, dizer que continua a sair muito sangue, que já me sinto fraca e que no piso 3 me aconselharam a fazer imediatamente a raspagem. No meio da experiência que vou viver há pelo menos um ponto positivo a reter. O material vai ser analisado, o que significa que, à partida, vou saber se havia alguma anomalia genética no embrião. É nisto que a médica se quer focar por enquanto. O resultado demora um mês a ficar pronto e a última FIV está prevista para fevereiro.

As festividades são em minha casa e praticamente tudo recai sobre mim. Estava a tentar orientar-me como é que ia ser se tivesse de ir no Natal ou Ano Novo para o hospital.

Este processo de expulsão está a ser mais moroso que a própria gravidez. Todas as transferências tiveram finais diferentes. Tantas coisas ainda podem acontecer em futuras TECs, nem quero pensar muito no assunto...

Ho! Ho! Ho! Vai ser um Natal memorável.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Farta de sangue!

No próximo domingo vai fazer 4 semanas que tive a hemorragia surreal que ditou o fim de mais uma gravidez. Desde aí que tenho perdas e há cerca de duas semanas limitavam-se a um corrimento castanho com libertação esporádica de coágulos. Esta noite, porém, acordei com dores na zona dos rins que se prolongaram durante algumas horas. Quando me levantei regressou a expulsão de vários coágulos e sangue vivo, tal como naquela fatídica tarde de domingo. Ainda não tem a mesma abundância mas o ato de me levantar significa saída de conteúdo. Lamento a descrição mas é a realidade com que estou a dar de caras.

Pensava que na altura do Natal a situação estivesse sanada e pudesse "esquecer" um pouco o assunto. Ao invés de sentir uma felicidade interior por faltar pouco tempo para atingir as 12 semanas de gravidez, de cada vez que vou à casa de banho ou me mexo, recordo-me que mais uma vez perdi um filho.

Participo no fórum demaeparamae e hoje li uma notícia muito triste de uma lutadora que há 9 anos tenta ser mãe. No último tratamento que podia fazer pelo SNS engravidou de gémeos. Está a passar por uma dor inimaginável e neste momento resta uma mãe destroçada e uma pequena bebé a lutar por se manter mais algum tempo a desenvolver no útero. ju-ju-ju não sei se vais ler este post mas desejo, do fundo do coração, que agora tudo corra pelo melhor.

São estes episódios que tiram toda a tranquilidade a positivos e barreiras de 3 meses. Convença-se quem faz estas caminhadas que um positivo tem pouco significado.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Aniversário do blogue

Hoje, dia 6 de dezembro de 2017, continuo a ver as evidências físicas da terceira perda de um filho. A hemorragia está na fase em que parece ter cessado mas as manchas persistem em não dar tréguas. Tenho em mente alguns pontos que irei falar com as médicas na próxima consulta para ver se a última FIV e possíveis transferências que posso fazer no público, ocorrem nas mais perfeitas condições.

Este mês assinala-se o segundo aniversário deste espaço no qual tenho vindo a exprimir ideias mais ou menos desconexas e, principalmente, libertar-me. Nunca imaginei que o alcance das minhas palavras fosse chegar a tantas pessoas, nos mais variados pontos do mundo. No meio dos inúmeros aspetos negativos que a internet tem, a ferramenta dos blogues pode ter impacto positivo e terapêutico tanto para quem lê como para quem neles escreve. Não tive qualquer pretensão de caráter comercial ao criá-lo e optei, desde que o idealizei, por dar relevância apenas a conteúdo escrito, sem qualquer imagem. Ao contrário da ponderação que exijo a mim mesma em tudo o que faço, a materialização do blogue surgiu num impulso, motivado por uma fase em que já não sabia como me libertar da dor que a infertilidade me infligia (e ainda continua). Olhando para trás, vejo que a escrita tem substituído muitas lágrimas que outrora derramava. Não vou mentir e dizer que deixei de chorar. Ainda acontece, embora de forma residual. As minhas almofadas têm agradecido imenso esta mudança. Eram as minhas maiores confidentes, o que me deixava mais abatida pela impessoalidade envolvida. Sei quão difícil é levar esta bofetada da vida e quis que o meu potencial futuro filho conhecesse a sua história com as emoções que senti em cada momento, muito antes de ele sequer existir.

Seja qual for o idioma que fale quem me lê e a forma como veio aqui parar, acredito que para a maioria a infertilidade diz-lhes alguma coisa devido à experiência pessoal ou por alguém que lhes é próximo e esteja a enfrentá-la. Gostava de poder anunciar que finalmente existem técnicas 100% fiáveis e seguras de ultrapassar a infertilidade. Infelizmente a utopia ainda é nota dominante e tenho sérias dúvidas que alguma vez se torne um facto real.

Há dois anos que escrevo aqui e o título do blogue continua, também ele, uma utopia.