sexta-feira, 26 de junho de 2020

Keep it simple

Está iniciada a temporada de preparação do endométrio para a TEC das TECs. Endométrio no sítio, ovários também, a motivação assim-assim... Hoje inicio 3 comprimidos diários de Estrofem e o Acfol. A tónica da equipa é manter a medicação básica. Compreendo a opção, pois se não há evidências de nada e os embriões são euploides, para quê entupir-me de outras coisas?
Qual o impacto do Covid? Acresce o andar mascarado, o constante desinfetar de mãos, a comichão no nariz provocada pela rinite que se tenta ignorar e que parece surgir em tom de provocação, os controlos de entrada no hospital, as máscaras que são alvo de desconfiança e trocadas por outras, a suspeita de que qualquer um de nós é uma potencial bomba que vai dispersar a ruindade no planeta, o atendimento muito mais rápido no piso 3, um novo documento para assinar, a colocação das roupas e pertences em quarentena quando se chega a casa, o banho descontaminante, o regresso à vida confinada e ao trabalho à distância que, aumenta de volume para combinar com a chegada de uma transferência que se pretende tranquila. Não estou a criticar o zelo que está a ser feito, não se pode facilitar e achar que toda a gente está livre da bicheza. A dinâmica que se instalou e a rapidez com que ela ocorreu é que ainda não me fez cair bem na realidade, porque vivo essencialmente confinada e cinjo-me às saídas essenciais. Tudo o que puder fazer autonomamente faço e isso não é muito diferente do que já era. Posso quase dizer que cresci isolada socialmente, o que acabou por moldar a minha maneira de ser.

Dia 7 de julho, bem cedinho, volto a fazer ecografia, nessa altura só poderei ir eu. Como os documentos estão assinados, o meu marido já não será necessário. Não sei se no dia da TEC ele estará autorizado a permanecer na sala de espera. A capacidade reduziu para 1/3, agora só podem estar sentadas seis pessoas.

Conto na altura da transferência estar praticamente sem serviço. Se houver alguma alteração em que seja convocada vou, pela primeira vez em 18 anos, meter baixa médica. Na TEC de fevereiro não tive oportunidade de me manter tranquila, muito pelo contrário. É a última vez que me disponho a tentar engravidar, não vou deitar tudo a perder. Quero, aliás, exijo para mim serenidade, até porque em seguida poderá começar o processo de luto e pretendo que a transição ocorra com alguma harmonia. Se não mereço um filho, espero que pelo menos possa ter tempo de me dar tempo.

quinta-feira, 25 de junho de 2020

Afrontamentos

Parei a pílula no domingo e depois disso passei a ter alguns momentos em que sou subitamente invadida por uma onda de calor que me põe a transpirar no rosto e costas. Tem curta duração, não mais de 15 minutos. Para aliviar o calor socorro-me da minha ventoinha de mão com manivela, que faz o pequeno milagre de rapidamente me restabelecer à minha duvidosa normalidade.
O alerta vermelho está a dar sinal, acompanhado de uma bela enxaqueca.  Amanhã é dia de ecografia e da tomada de conhecimento do plano de ataque. Estou com um pressentimento que não vai haver novidades na medicação e vigorará a simplicidade, ou seja, Estrofem, Acfol e Progeffik. A tiróide, está morfologicamente bem, fiz esta manhã mais uma ecografia de controlo. Preocupa-me a parte bioquímica que só saberei daqui a uma semana. A sintomatologia que me faz ligar o alarme de disfunção está atenuada mas só ficarei totalmente convencida do sucesso da nova dosagem de Eutirox após a realização das análises.

Neste momento parece que tenho a minha cabeça metida numa prensa, entalada entre a zona parietal e a frontal, em que alguém vai apertando lentamente o parafuso até a deixar na eminência de explodir. São assim as minhas enxaquecas.

Ensaio clínico "RESET" IVI Lisboa

A clínica IVI encontra-se a recrutar pacientes para um ensaio clínico cujo objetivo é avaliar o efeito de diferentes protocolos de estimulação ovárica na recetividade endometrial.
Se houver alguma leitora interessada, pode consultar mais informações em https://bit.ly/3fVFdsL e/ou enviar e-mail para a Coordenadora de Estudos Científicos - Carla Jorge, no endereço carla.jorge@ivirma.com. A informação indicada no site que apresentei encontra-se em inglês. Caso alguém tenha dificuldade em compreender o conteúdo, pode solicitar ajuda na área de comentários, estou disponível para traduzir. Os critérios de elegibilidade para o ensaio são bastante extensos mas mesmo assim penso que se enquadram no perfil de uma fatia significativa das mulheres que recorrem às técnicas de PMA. Não sei se também não poderá constituir uma oportunidade para haver um acompanhamento mais económico na IVI. Não encontrei referências a esse nível mas se alguém tiver interesse em participar no ensaio, pode aproveitar para questionar a Coordenadora e, já agora, dar-me feedback para eu colocar aqui essa informação. O conhecimento científico envolvido na PMA precisa de evoluir e neste tipo de assuntos, apenas com uma participação ativa dos pacientes se consegue progredir.

quarta-feira, 17 de junho de 2020

TEC 9 a caminho!

Recebi esta manhã a chamada que confirmou que a TEC 9 vai concretizar-se. Dia 21 de junho termino a pílula e a 26 vou fazer ecografia. Vamos também assinar o consentimento para a desvitrificação dos dois mini-nós, a nossa última esperança. Sinto que o fardo que carrego está mais leve. O fim está aí, acho que estou preparada para o que se segue. O desenvolvimento da nossa jornada na infertilidade foi estranho. Às vezes parecia que não estava a viver nada daquilo e que não passava de um longo sonho do qual não acordava. Focámo-nos nos últimos dois anos em terminar isto, por nos estar a fazer mais mal que bem. É chegada a hora. Incrivelmente encerro o processo com a mesma determinação com que o comecei.
Mesmo que a TEC seja infrutífera, tal como todas as outras, não sairei com rancor do Hospital de S. João sobre o qual apostei as minhas fichas, ainda nem sequer conhecia o meu marido. Sei que a equipa desejou tanto quanto nós que as coisas resultassem e fizeram o que podiam para nos ajudar a conquistar o nosso sonho. Digo, mais uma vez, que são excecionais, apesar dos problemas de que padecem com a falta de capacidade de resposta, em tempo útil, para tanta gente que necessita dos seus serviços. Se houver uma reviravolta na nossa história, é lá que quero continuar até chegar o dia que mudará a minha existência.

Se sobrar alguma justiça neste mundo, gostava de ser poupada de outra perda. Acho que o luto da desistência será mais fácil de suportar se tiver logo resultado negativo. Estou a traçar vários cenários mas não me posso esquecer da questão da desvitrificação que pode não correr da melhor forma. Então, em primeiro lugar, espero que o endométrio se porte bem, em segundo que haja, pelo menos, um mini-nós apto a transferir. Depois disso, aceito um negativo ou uma gravidez como manda a lei. Situações que fujam destas duas hipóteses, só irão reforçar a crueldade que tem caído sobre nós.

De uns anos a esta parte a asma tem voltado. Sou asmática desde sempre, tive uma infância complicada por causa disso. Houve também fases da adolescência em que esporadicamente era acometida por crises com uma certa violência. Ao chegar à idade adulta voltei a ter episódios menos intensos e, mesmo agora, de vez em quando, tenho de me socorrer do inalador. Nos últimos 3 anos, a minha época oficial para o regresso da asma é em junho. Não tem nada a ver com o que sentia quando era miúda, contudo há sempre o receio de que volte a causar-me grandes sustos. Durante estes dias tenho sentido a minha capacidade respiratória mais débil e espero que na altura em que faça a transferência não piore, para não ter de fazer inalações. Vou, no entanto, pôr as médicas a par da situação. Dia 30 farei novamente controlo da função tiroideia e estou a torcer todos os meus dedinhos para que finalmente a tiróide tenha outra vez a TSH normalizada. Será um problema se não tiver estabilizado. Há perto de um ano que ando a tentar fazer o acerto adequado. Tenho ódios de estimação de algumas partes das minhas entranhas. No topo da tabela estão os ovários, em segundo lugar a tiróide.

A ação vai regressar rapidamente, nos próximos dias deixarei aqui as palavras que vão retratar o final de uma luta com 8 anos e 7 meses.

domingo, 7 de junho de 2020

Outra forma de pressão social

Fazendo uma retrospetiva, foram residuais as situações em que senti algum tipo de pressão social para constituir família. Posso até dizer que fui incentivada umas quantas vezes para o contrário.
Depois de ter aberto a porta à PMA e partilhado a minha história a diferentes pessoas, umas mais próximas que outras, deparei-me com um tipo de pressão cada vez mais acentuado. A mais óbvia, completamente previsível, é a clássica questão se já ponderámos a adoção. O mais habitual é o interlocutor ser alguém que não tem muito conhecimento sobre a procriação medicamente assistida ou adoção. A tendência mais recente, que tem crescido a um ritmo alucinante é, se a ovodoação faz parte dos nossos planos. Essa questão normalmente é colocada por alguém que passa/passou por um processo de infertilidade.

Quem pergunta quando é que a família cresce não o faz, à partida, com má intenção. Da mesma forma, o tema da adoção ou ovodoação não surge com caráter pejorativo. Vem numa tentativa de, alguma forma, ajudar ou dar conforto. Há dias contudo, em que qualquer uma dessas questões maça um pouco a paciência, podendo aumentar a dor emocional causada pelo fracasso. A forma como se reage quando se é interpelado depende de cada um e da disposição em que se encontra na altura em que é confrontado.

Vou fazer pela n-ésima vez algumas considerações sobre este assunto. A adoção, assim como a doação de gâmetas/embriões não estão no nosso horizonte.
A ovodoação nunca nos foi sugerida pelos vários profissionais que nos têm acompanhado e não me refiro só à equipa de PMA do HSJ. O que vou escrever a seguir pode ser mera especulação para justificar a insistência dos profissionais nos nossos gâmetas. Estou no extremo oposto da falência ovárica. A poucos dias de fazer 40 anos a minha AMH era superior a 10. A qualidade ovocitária pode não ser catastrófica por algumas razões: em 3 processos de estimulação houve 20 embriões aparentemente aptos para transferir. A taxa está certamente acima da média. Até à data, apenas três embriões deixaram de evoluir após desvitrificação. Vale o que vale. Outro aspecto que pode indiciar baixa qualidade dos ovócitos é a prevalência de aneuploidias. Ora, dos 12 primeiros embriões transferidos, sei que um era euploide, a minha menina. No rastreio de aneuploidias a 5 embriões, 3 eram normais. Acho esse resultado bom, considerando que se tratou da estimulação realizada em idade mais avançada. Não me sai da cabeça que uma parte considerável dos embriões anteriores poderia ser também euploide mas nunca o saberei. Em relação às perdas precoces, estas podem dever-se a lacunas na qualidade dos gâmetas que originaram os embriões, é um facto. Uma das indicações para a doação de ovócitos é o insucesso em diversas tentativas no entanto, apesar do meu historial, ninguém sugeriu essa alternativa.

Em conversa com o meu marido, se calhar ainda nem estávamos a meio de todas as desilusões com que fomos "presenteados", toquei no assunto da ovodoação. Fiz eu a abordagem, porque estou muito mais dentro do assunto da PMA do que ele. Preparei-o para a eventualidade de algum dia um médico falar dessa opção. Refletimos em conjunto, falámos novamente da adoção e acordámos continuar a tentar com as nossas células enquanto tivéssemos disposição para tal. Estranho seria se, depois de tantos anos e tentativas, nunca tivéssemos analisado a viabilidade de outras alternativas, mesmo sem estas terem sido equacionadas pelos profissionais. Mantivemos ao longo do tempo a nossa intenção e estamos tranquilos quanto a isso.

É curioso que na maior parte das vezes que me perguntaram se ponderámos a doação de gâmetas referiram-se aos ovócitos e não aos espermatozóides. Nesta equação somos dois e não vamos colocar a causa apenas a recair sobre mim. Apesar do meu marido ter uma filha, jovem adulta, os espermatozóides dele podem não ter a dita qualidade adequada para gerar embriões que evoluem sem problemas.

A infertilidade idiopática é irritante. Questiona-se tudo e não se conclui nada.

Resumindo: sim, obviamente discutimos entre nós se íamos enveredar pela ovodoação e não, não vamos.

quarta-feira, 3 de junho de 2020

Hirsutismo

Uma das evidências que apresento, que corrobora o diagnóstico de SOP, é o hirsutismo. Com o passar dos anos acentuou em algumas zonas, embora haja partes do meu corpo em que não existe qualquer crescimento anómalo de pêlo. Quem olhar para a escala de Ferriman e Gallwey pode ficar um pouco impressionado com o grau de pilosidade que pode ser atingido. Há uns meses achava que a situação estava a ficar descontrolada, pela rapidez e quantidade de pêlos que apareciam, literalmente, de um dia para o outro.
Não era fã de pílulas. Tive uma má experiência com a Yasmin. Durante os 3 anos em que a tomei não notei nenhuma redução no hirsutismo mas nessa altura fazia as pausas normais de 7 dias. Sentia-me mal, principalmente no verão, mas o endocrinologista desvalorizava as minhas queixas. Alegava que era uma pílula muito boa, por ter uma composição à base de produtos naturais. Não era ele que a estava a tomar e a ter efeitos indesejáveis, então borrifava-se para o que eu dizia.

Atualmente estou a tomar Gynera, de forma contínua desde março e sinto-me bem. Em fevereiro, quando iniciei a terapêutica tive cãibras nos gémeos durante o sono, cansaço nas pernas, enxaquecas, spotting o tempo todo até ter a hemorragia de privação. Pensei que quando começasse a segunda caixa que, a partir daí seria sem interrupções, fosse acontecer o mesmo. Enganei-me redondamente. Apesar das elevadas temperaturas dentro da minha casa, não tenho cãibras noturnas, as enxaquecas são ocasionais, não há spotting e o que me está a deixar radiante, o hirsutismo diminuiu bastante no rosto. 

Eu tinha reservas sobre o que iria fazer futuramente para induzir as hemorragias de privação. Não me interessava a pílula pelo que acontecera com a Yasmin. Provera ou Progyluton não reduzem o hirsutismo mas funcionam para ter ciclos artificiais. Sobre a diminuição do pêlo onde ninguém quer, não sei se a depilação a laser seria uma boa alternativa para mim, devido às constantes flutuações hormonais. Tenho de falar com alguém que perceba realmente do assunto. Em relação à parte hormonal e o meu seguimento no futuro, estou a pensar eleger como minha ginecologista uma das médicas que me acompanha no HSJ, por já conhecer esta criatura alienígena que está a mandar bitaites no blogue.

Depreendo que se fizesse hoje uma ecografia, os dois safados que me infernizam há décadas estivessem irreconhecíveis, com um ar inocente e limpo. As flores de lótus secas devem ter dado lugar a dois ovários. A limpeza química que está a ser realizada àqueles filhos da mãe poderá ser realmente uma vantagem para a TEC, na medida em que os androgénios estão diminuídos em relação ao que é habitual e os ovários menos tóxicos. Quando suspender a pílula, o retrocesso será rápido, no entanto tenho esperança que a implantação do(s) mini-nós aconteça antes que regresse o caos.