sábado, 30 de dezembro de 2023

Súmula de 2023

O ano foi cansativo mas compensador. Não se desviou muito do que esperava.

Concluí a licenciatura e graças à aposta que fiz em voltar ao ensino superior, mudei de profissão. Trabalho a tempo inteiro, voltei a sentir-me útil. Só gozei verdadeiramente seis dias de férias, porque não pude requerer o estatuto de estudante-trabalhador e usei os outros seis na época de exames do segundo semestre.

Estou a ter possibilidade de me dedicar um pouco mais a mim, continuo lentamente a perder peso (até ao momento uns 14 kg desde a pior fase que registei), só o peito que cresceu ainda mais com os tratamentos é que não reduz um milímetro que seja.

Ando a tratar mais uma infeção respiratória, virou rotina anual.

O meu marido descobriu que tem mutação no Fator V de Leiden (heterozigótica), na sequência de tromboses que teve no passado e duas este ano, pouco espaçadas, após uma cirurgia às varizes que fez há um ano. O apixabano entrou permanentemente na vida dele. Por haver 50% de hipóteses de transmitir à descendência, a filhota vai fazer estudo genético. Ela tem 25 anos e é importante estar de prevenção.

A minha menina de bigodes tem 12 anos, já só tem 3 microdentes e continua a ser a reguila mais meiga e safada que tão bem me faz. Foi tosquiada pela primeira vez e o pêlo tem crescido a uma velocidade alucinante.

Sou uma felizarda por não estar angustiada como andei tanto tempo, permito-me sonhar e fazer novos planos para o futuro.

Participei em duas iniciativas relacionadas com o meu percurso na infertilidade e saúde mental, tive novo convite para ir a um programa de televisão (declinei outra vez, a minha opinião não mudou), em breve conto divulgar mais pormenores das minhas intervenções.

Desejo um excelente ano de 2024 a quem está desse lado, seja qual for a sua origem geográfica, todos são bem vindos. A paz e o sossego de espírito que almejo para mim espero que se estendam a quem anda inquieto.

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Tempo e €€

Enquanto frequentei o serviço de PMA do HSJ este funcionava durante o período da manhã sendo que, em situações de punção e outras pontuais, a sua atividade poderia estender-se até às 14h/14h30. Foi encontrada uma forma de encurtar os cada vez mais longos tempos de espera que foram dilatando desde a pandemia. A RTP realizou uma reportagem sobre o assunto e pode ser visualizada aqui: https://www.rtp.pt/noticias/pais/hospital-sao-joao-procura-mudar-cenario-da-procriacao-medicamente-assistida_v1523520

Acredito que seja uma medida provisória até restabelecer a relativa "normalidade" pré-pandémica. Possivelmente esta alternativa é financeiramente mais económica que estabelecer protocolos com clínicas privadas para poder dar cumprimento ao que está legalmente previsto e que só acontece em Lisboa (no Hospital de Santa Maria e MAC, salvo erro). Aqui a norte sempre houve resistência e "desconhecimento" do mecanismo de encaminhamento para unidades de PMA privadas quando os tempos de espera ultrapassavam 12 meses.

Qualquer iniciativa para a redução dos tempos infinitos que só jogam contra a natureza é bem vinda.

Outra novidade está a ser preparada, relacionada com infertilidade. Logo que possa darei mais informações. Como tenho vindo a defender, tudo o que eu puder fazer para dar algum tipo de apoio, estarei presente.

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Tempo de antena

Li algures que a Suzana Garcia foi ao programa Goucha. Dei uso à box da TV e assisti ao tempo que lhe foi dedicado. Sabia que ia identificar-me com o que ela diria sobre o seu percurso tumultuoso e não me coibi em emocionar com a sua intervenção, várias vezes. Tudo o que ela sentiu, excetuando a parte religiosa, que nada me diz, habitou no meu íntimo, anos a fio. Os receios que teve nesta gravidez bem sucedida correspondem exatamente aos que me transtornavam, até na parte relativa à preparação da chegada dos filhos. Foi uma entrevista bem conduzida, honesta.

domingo, 30 de julho de 2023

Esclarecimento de dúvidas sobre a PMA em Portugal

Algumas pessoas que me acompanharam há uns anos, "conheceram-me" através do fórum dedicado à infertilidade da página "De Mãe Para Mãe", na qual ainda intervenho de vez em quando. Não é por ter encerrado o meu capítulo que vou deixar de esclarecer dúvidas ou prestar algum tipo de apoio porque, infelizmente, não param de surgir pessoas que estão a passar pelas mesmas angústias que outrora tive e procuram algum amparo.

Há bastante curiosidade sobre números relacionados com a PMA em Portugal e taxas de sucesso e, a meu ver, a fonte que mais informação nos dá é a Comissão Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA). Na sua página podem ser consultados relatórios, a legislação, atas e é nos relatórios anuais de atividade de PMA que se encontram especificados, para diferentes situações, os tais números tantas vezes solicitados.

O HSJ é o único centro de PMA público, a nível nacional, que realiza PGT-A. Quando a equipa médica me propôs a realização dessa técnica, em 2019, disseram-me que seríamos dos primeiros casais a efetuá-lo. Por curiosidade, hoje li o relatório da atividade de 2019 e percebi que, na realidade, fomos o primeiro casal e o único naquele ano, que efetuou biópsia aos embriões para rastreio de aneuploidias, no SNS. Ao consultar há uns anos as atas mensais das reuniões da CNPMA, consegui também identificar em que altura foi dada autorização para que eu pudesse submeter-me à técnica. Claro que o meu nome não foi referido em nenhum desses documentos, mas pela cronologia, histórico e idade, foi fácil para mim identificar-me nos casos mencionados.

A página da CNPMA é de fácil consulta. O endereço é https://www.cnpma.org.pt/ Acho que vale a pena visitá-la, fi-lo ao longo dos anos, porque às vezes há legislação que muda e não é divulgada nos meios de comunicação social. Esmiuçar o site não é, de todo, tempo perdido.

domingo, 23 de julho de 2023

É oficial, licenciatura concluída 🎉

Hoje é o primeiro dia do resto da minha vida 😃

Ainda não caí em mim que já vou ter tempo livre, serões descansada, sono tranquilo e ócio! O dia a dia improvisado vai terminar, vou estar disponível para mim e para os meus, os tempos que ainda pareciam de confinamento chegaram ao fim. Foram três anos exaustivos, mas tinha mesmo de enveredar por algo assim para que a transição da desilusão dos 8 anos e 8 meses para o que aí vem, me traga ânimo. Digamos que foi o tipo de luto que decidi realizar. Estou feliz, embora ainda não tenha despertado bem para a nova realidade, porque penso sempre que não tenho direito a dias melhores.

Há uma viagem na calha, daqui a uns meses, vamos ver se se concretiza.

Notei, nestes anos, um pouco do efeito do tempo no meu envelhecimento. Há que libertar do que já não importa, valorizar as pequeninas coisas e descobrir outras que nos provoquem rugas de felicidade.

quinta-feira, 20 de julho de 2023

A 9,5 valores de uma meta

Estou a poucos dias de saber se a primeira etapa do meu plano de renascimento está realmente concluída ou não.
A gestão da vida pessoal com o meu objetivo de fazer a licenciatura nos três anos foi, sem dúvida, a parte mais difícil. A forma como perspetivava que iria decorrer todo o processo não correspondeu, em nada, à realidade. Foi extenuante, não considero que tenha sido mais complexo do ponto de vista do conteúdo, relativamente à primeira licenciatura, mas estou cansada, muito cansada.

Como já tinha referido anteriormente, a empresa onde estagiei manifestou interesse em que trabalhasse lá e, no último dia de estágio, foi oficializada a contratação. Esse aspeto foi mais rápido e fácil do pensava. Preocupava-me que a idade pudesse vir a constituir um entrave e a nulidade que a minha experiência profissional representa para as empresas que atuam na área em que estou a concluir a minha formação.

Chegou a hora de voltar a viver, depois de um interregno de sensivelmente uma década, em que somente existi.

Não há ressentimentos para trás, estou muito bem com a decisão tomada de parar de tentar ter filhos e só quero ter plena saúde para poder usufruir do que a vida ainda pode proporcionar.


Para quem aqui veio parar, que se está a degladiar com uma dificuldade em engravidar e, eventualmente, vai recorrer ou já realizou tratamentos de PMA, tenho algo a dizer. Eu conheço demasiado bem todas as frustrações pelas quais estão a passar. Uma das grandes fontes de dor provinha daquelas frases motivacionais aparentemente inofensivas de que não devia desistir ou que não se desiste de um filho. Como o meu caso se estava a tornar infindável, entrei num abismo em que deixei de me reconhecer. Ao tomar consciência daquilo em que me transformei, percebi que deveria ponderar até que ponto estaria disposta a continuar a sacrificar-me por um desejo que não se estava a concretizar. A ideia de desistência foi ganhando terreno à medida que os fracassos se sucediam. Percebi que não podia desistir de mim, pois era o que, gradativamente, estava a acontecer. Pode dar urticária ou taquicardia a algumas pessoas, este tipo de atitude mas, sinceramente, estou-me nas tintas, porque foi uma decisão que tomei para a MINHA vida. Não podemos cair no erro de atribuir a única fonte de felicidade a um filho e achar que mais nada nos fará felizes. Porque não desistir? Antes de "incentivarem" alguém a não desistir, pensem no efeito nefasto que esta aparente motivação pode trazer. Sei que, na maior parte das vezes, não há intencionalidade, é uma forma de tentar animar mas, para pode ter um efeito muito mais negativo do que se possa pensar.

sábado, 25 de março de 2023

O sol começa a brilhar

Ainda estou a processar esta última semana e meia. Iniciei o estágio no dia 22 de fevereiro e a 14 de março fui convidada a trabalhar na empresa, já a partir de abril. Uma das colaboradoras vai ficar até ao final do próximo mês, estiveram a avaliar-me naqueles poucos dias em que estive a apoiar as várias áreas do departamento onde me encontro e viram que tinha perfil para lá trabalhar. Encontro-me em formação com ela, a partir de terça-feira começo a entrar no mesmo turno. O que estava inicialmente delineado seria desenvolver o tema do meu relatório de estágio noutro departamento, a partir de 16 de março. Devido a esta situação, que ainda não está formalizada, gerou-se então mudança de planos quanto ao tema a trabalhar, mas a empresa já entrou em contacto com a instituição onde estou a estudar, informando-os do assunto. Quando fui à entrevista durante a fase de seleção de potenciais empresas do meu interesse, percebi que lá haveria uma forte possibilidade de conseguir trabalho após a conclusão do curso, ao contrário de outros locais.

Quis muito ter alguma tranquilidade, pois vivi anos conturbados. Com o aproximar do fim do curso preocupava-me como iria correr a procura de trabalho devido à idade, ao background profissional que poderia ser irrelevante para as empresas que, aliado à idade, levaria a afastar uma eventual contratação. Pensei seriamente, vezes sem conta, se seria uma boa aposta formar-me novamente. Não queria passar por outro fiasco. Felizmente, posso acreditar que consegui atravessar essa montanha. Independentemente disso, a minha principal meta é ter o certificado na mão, ainda que a conclusão da licenciatura esteja envolta de uma responsabilidade acrescida.

Não só eu fiquei mais tranquila, como a minha mãe. Acho que ela finalmente percebeu que este novo caminho que comecei a trilhar em 2020 me vai trazer mais estabilidade do que se continuasse a insistir em manter-me na minha área de formação inicial, que era o que ela queria. O amor à profissão, por si só, não coloca comida na mesa, não paga as contas. A situação piorou quando passei a trabalhar a tempo parcial, por valores hora baixos, para poder ter as manhãs disponíveis sempre que precisasse de ir ao hospital. E foram mais de cem manhãs, em cinco anos...

Aparentemente, desta vez, é um esforço que está a ser compensado e espero que a médio/longo prazo continue a trazer frutos.

É um alívio, precisava mesmo disto!

domingo, 12 de março de 2023

Reta final

Aquele que pretendo que seja o último semestre, o da conclusão do primeiro plano de reestruturação pós-infertilidade, iniciou no mês passado. Comecei o estágio curricular num laboratório a 20 km de casa e está a ser uma lufada de ar fresco sentir-me útil, ainda que como rookie. Para a instituição seria pouco emocionante e leve ter apenas o estágio. Para apimentar mais a reta final e não ficarmos mal habituados depois da sobrecarga que foi todo o curso, além dos 4 dias completos de estágio, há mais um com aulas laboratoriais das 8h10 às 18h, com 1h10 de almoço e 10 minutos de intervalo, às 10h. Além disso, às terças e quintas-feiras saio do estágio na esperança de não ficar retida na VCI para ir às aulas das 18h10 às 22h30, com pausa de 40 minutos para jantar, às 20h. Acrescem os variados relatórios, um projeto, quase tudo para ser entregue e apresentado num intervalo de poucos dias. A saga finaliza com a entrega do relatório final do estágio, exames e a prova final do estágio, algures durante a época de exames.

Nos fins de semana tenho os meus momentos Master Chef para a preparação das marmitas dos dias vindouros. Preciso de 7 em cada semana, pois quando tenho aulas pós-laborais necessito de trazer comigo almoço e jantar. Como há noites em que a competição por microondas pode ser feroz na instituição, opto por preparar para esses jantares pratos que podem ser consumidos frios. Uma vez que há frigorífico na empresa onde estou a estagiar, posso conservar os alimentos no frio durante o dia.

Faltam 19 semanas para, espero eu, respirar de alívio e começar a aproveitar um pouco melhor o tempo em que cá ando, com um trabalho digno. De acordo com a informação do portal da Segurança Social Direta, daqui a 24 anos e 4 meses reunirei condições para começar a usufruir da pensão de velhice, sem penalizações. Ainda tenho de ser produtiva durante um bom tempo.

Luta atrás de luta, está a chegar a hora de deixar de me sentir um parasita.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

20 anos de ausência

Faz hoje 20 anos, era um domingo ensolarado e, dentro do quarto, na casa que lutou para construir, o meu pai começou a agoniar. Os rins estavam a entrar em falência. Às 17h20 deu-se a libertação. Não vou entrar em mais detalhes...

Revivo quase diariamente as horas desse maldito domingo e, apesar da dor gigante de ter assistido a tudo, se há algo de bom que se possa retirar da experiência, é que ele não esteve sozinho. Nós, por outro lado, pudemos acompanhá-lo na profunda dor que ele sentia, porque além da componente física, excruciante, não partiu em paz. Estava frustrado, pois achava que não tinha cumprido tudo o que faltava para nos libertar de preocupações.

Foi a verdadeira confrontação com a finitude, um momento em que emergiram um nojo e ódio profundos pela vida e a perceção de que somos criaturas insignificantes perante a física, a química, a biologia. Antes desse acontecimento não vivia num mundo de purpurinas. A dor do silêncio transformou-me. Preparou-me para novos silêncios que se seguiram.

Não se supera.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

A ternura dos "entas"

Ontem completei mais uma translação ao Sol. A entrada nos "entas", iniciada em 2020, já está bem consolidada. Fui aprendendo com a vida a relativizar mais os acontecimentos, deixei de dar importância a pormenores que consumiam a minha beleza, a paciência para picuinhices reduziu drasticamente. Tenho esperança que ainda vou fazer umas coisas interessantes e sentir entusiasmo com novas descobertas.

Nos olhos começaram finalmente a aparecer algumas rugas acentuadas pelo sorriso, as madeixas brancas no cabelo vão multiplicando serenamente. As mazelas físicas mal resolvidas que foram surgindo ao longo dos anos dão por vezes sinais de vida, os problemas respiratórios diagnosticados logo na primeira consulta que tive, logo que nasci, vão voltando a acentuar-se, após um adormecimento aparente.

Quando era novinha, adorava ver e rever os álbuns fotográficos da família. Tenho algumas memórias registadas em suporte físico, maioritariamente tiradas quando vivia em França, onde revelar fotografias era mais acessível que em Portugal. Desde que me mudei para cá e até por volta dos 26 anos, parece que não existi. Da minha adolescência tenho umas apenas umas três fotografias tipo passe, por causa do cartão de estudante, dos tempos de universidade não tenho praticamente nada. Só quando comprei uma máquina fotográfica digital, penso que com 26 anos, é que voltei a ter registos. Apesar dos milhares de memórias estarem gravados em diversos suportes digitais, poucos são os que tomaram a forma de papel fotográfico. A diversidade e qualidade de imagem é imensa, comparativamente com os recursos limitados de que dispunha dantes, mas perdeu-se a magia da abertura de um álbum fotográfico, daquele barulho característico a virar cada página, do cuidado ao manipular as fotografias para não se estragarem. Fez ontem 43 anos que nasceu, algures em terras gaulesas, uma miúda com um ar assustador, toda arranhada na face, porque as suas mãozinhas não faziam outra coisa que não fosse desfazer a cara. Tenho uma cicatriz que se destaca na bochecha direita, feita por moi-même, no alto dos meus dois dias de idade. Durante muitos anos também se viam as que fiz no nariz, nesse mesmo dia, mas essas suavizaram depois dos 30 anos. Ainda atualmente, há alturas em que me apetece arrancar partes da cara, quando as alergias estão em alta. Há que manter a coerência!