Faz hoje 20 anos, era um domingo ensolarado e, dentro do quarto, na casa que lutou para construir, o meu pai começou a agoniar. Os rins estavam a entrar em falência. Às 17h20 deu-se a libertação. Não vou entrar em mais detalhes...
Revivo quase diariamente as horas desse maldito domingo e, apesar da dor gigante de ter assistido a tudo, se há algo de bom que se possa retirar da experiência, é que ele não esteve sozinho. Nós, por outro lado, pudemos acompanhá-lo na profunda dor que ele sentia, porque além da componente física, excruciante, não partiu em paz. Estava frustrado, pois achava que não tinha cumprido tudo o que faltava para nos libertar de preocupações.
Foi a verdadeira confrontação com a finitude, um momento em que emergiram um nojo e ódio profundos pela vida e a perceção de que somos criaturas insignificantes perante a física, a química, a biologia. Antes desse acontecimento não vivia num mundo de purpurinas. A dor do silêncio transformou-me. Preparou-me para novos silêncios que se seguiram.
Não se supera.
Um xi 🤍
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